Rádio experimenta convergência com novas mídias

Pesquisadores discutem os caminhos possíveis para a sobrevivência do rádio em uma era multimídia

 

Por Tiago Gebrim
 
Os estudos sobre radiofonia também estiveram presentes no Intercom Centro-Oeste. A professora Nélia Del Bianco, da Universidade de Brasília, juntamente com o professor José Wagner Ribeiro, da Universidade Federal de Alagoas, apresentaram estudos que procuram entender e propor soluções para a crise em que o rádio tradicional está colocado desde o surgimento das chamadas novas mídias. O painel, denominado Rádio e Interatividade, teve mediação do professor e pesquisador da Facomb, Luiz Signates.
Em sua fala, Nélia chamou a atenção para a convergência midiática. Não apenas para as mudanças tecnológicas dos meios em si, mas para as implicações que elas acarretam na cultura de uma nova geração. Uma cultura em que os consumidores da mídia saem da posição de receptores, ainda que (inter)ativos, e se alocam como produtores midiáticos, a partir da visibilidade e possibilidade participativa que a internet e o celular oferecem.
Ilustrando as mudanças a que se refere, a professora exibiu uma pesquisa de sua autoria, realizada na UnB. Nela 350 estudantes responderam a perguntas acerca de consumo individual que fazem da mídia. Os resultados chocam: enquanto 316 e 298 do total fazem uso, respectivamente, do celular e da internet todos os dias, apenas 98 ouvem rádio nessa mesma medida, mas de acordo com Nélia, mesmo essa audiência é inercial: os jovens “ouvem o rádio quando entram no carro do pai e está sintonizada na CBN, e aí eles 'tem' que escutar até chegar à faculdade, por exemplo”. A partir daí, Nélia Del Bianco mostra soluções que as rádios estão encontrando para se adaptar a esse novo cenário midiático.
Novos suportes - Uma das alternativas é ampliar o canal de comunicação com o ouvinte através da internet. Utilizando-se de comunidades virtuais como o Orkut e ferramentas de divulgação e interatividade como o Twitter e a manutenção de sites próprios, as rádios garantem um contato mais abrangente com seus usuários. No caso de comunidades onde a programação é discutida pelos participantes, é mais fácil acompanhar a aceitação de determinado programa, bem como perceber falhas e acertos ao saber o que é dito entre os ouvintes e não chega aos canais diretos da emissora.
De outra maneira, o que está acontecendo é a mudança de suporte: ao invés das ondas de rádio, as ondas da rede virtual. Muitas rádios estão adaptando-se para a existência paralela ou mesmo exclusiva na internet. Essa tecnologia permite a uma rádio oferecer serviços interativos absolutamente novos. Como exemplo, Nélia cita emissoras que disponibilizam aplicativos para celulares com capacidade de acesso à web. Com eles, o ouvinte acessa a rádio on-line em qualquer lugar, monta sua lista de músicas, acessa arquivos de programas já transmitidos, interage em tempo real. A operadora de telefonia Oi, que no sudeste possui uma emissora de rádio de mesmo nome, permite que o usuário monte uma playlist e envie para que seja executada durante certa programação. Além disso, é possível que o ouvinte crie um alerta para ser avisado via mensagem de texto quando sua música predileta for ao ar.
Rádio e internet - Em outra direção, o professor José Wagner apresentou um experimento realizado na universidade de Alagoas com emissoras de rádio tradicional. Ele propôs a duas empresas de rádio que transmitissem sua programação em formato audiovisual via internet (e uma delas também em um canal de TV por assinatura), sem nenhuma adição estética: o estúdio é filmado ao vivo e mostra tudo exatamente como acontece. A resposta do público foi surpreendente: não só a audiência como também a interatividade cresceram bastante.
O programa Cidadania, apresentado por França Moura, hoje tem 40% de seu conteúdo determinado pelos próprios ouvintes. O locutor mantém um notebook a sua frente durante toda a transmissão, e responde e comenta as mensagens enviadas pelos ouvintes/telespectadores em tempo real. São tantas mensagens, diz o professor Wagner, que a emissora já pediu à universidade a contratação de dois estagiários apenas para cuidar das respostas. Essa interação via e-mail tem uma vantagem em relação ao telefone: ao contrário desse último, a mensagem escrita não permite que um ouvinte fale um disparate em plena transmissão ao vivo, o que geralmente é constrangedor. A possibilidade de selecionar o que será respondido, ali, na tela do computador e tão logo é emitido pelo espectador, traz benefícios à apresentação.
Outras mudanças foram proporcionadas por esse experimento: donas de casa, que não tinham o costume de usar computador ou muitas vezes nem sequer sabiam suas possibilidades se habituaram forçadamente com a máquina para acompanharem a programação radiofônica pela internet. Vai além: a interação do ouvinte pode ser feita pelo celular. Wagner explica: se antes um ouvinte ligava, por exemplo, da frente de um hospital e falava que ali havia um tumulto de tal proporção, era preciso enviar um repórter ou contatar uma autoridade para averiguar a informação antes de repassá-la ao público. Hoje, com o suporte visual, o locutor pergunta ao ouvinte se ele pode tirar uma foto com o celular e enviá-la ao e-mail do programa, e basta isso para se ter a confirmação instantânea do fato alertado.

A pergunta que permanece, inquietante e ainda sem resposta, é até que ponto o rádio continua a ser rádio, em essência. Essas adaptações, apesar de necessárias à sua sobrevivência, tiram dele sua existência como canal de áudio exclusivamente. O resultado dessa convergência, salienta o professor Signates, talvez não possa ser chamado de rádio, mas um terceiro produto, fruto do esforço desse meio de comunicação “monomídia” para resistir a um novo cenário, agressivo, dominado pelos meios “multi”mídia.

Fuente: Facomb/UFG